BRASÍLIA - O senador e ex-presidente Fernando Collor (PTB-AL) usou a tribuna do Senado nesta segunda-feira para comentar a sua absolvição em ação penal julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada. O senador quase verteu lágrimas em alguns momentos do discurso e questionou a quem caberia a responsabilidade pelas acusações que sofreu e desdobramento delas.
- Depois de mais de duas décadas de expectativas e inquietações pelas injustiças a mim cometidas, cabe agora perguntar: quem poderá me devolver tudo aquilo que perdi? A começar pelo meu mandato presidencial e o compromisso público que assumi, a tranquilidade perdida por anos a fio. Quem pagará pela difamação insana, pelo insulto desenfreado, pela humilhação provocada, pelas provações impostas, ou mesmo pelas palavras intolerantemente pronunciadas e, mais ainda, inoportunamente escritas? - cobrou Collor.
O senador criticou o presidente do STF, Joaquim Barbosa, que admitiu a demora em julgar o caso, o que levou alguns crimes a prescrever.
- Isto não é crível nem prudente a um presidente do Supremo Tribunal Federal, ainda mais se nada do que disse reflete a verdade do juízo - disse. - Para um denunciado injustamente, a demora em se julgar torna-se um martírio, uma perversidade sem igual da própria Justiça - defendeu Collor.
Sobraram críticas para Ministério Público e para a imprensa. O senador classificou como 'grave e tenebrosa' a atuação do MP no caso e afirmou que a denúncia foi embasada em transcrições deturpadas de depoimentos colhidos durante as investigações.
Ele afirmou que ao ver o julgamento acontecer teve de relembrar e reviver "acusações infundadas" das quais foi alvo, de forma injusta, segundo ele. Para ele, a absolvição mostra que o Supremo "ratifica" sua inocência e permitirá que a história do período de seu governo seja reescrita.
- A decisão do Supremo Tribunal Federal permitirá mais do que o resgate da justiça e da imagem de um homem público, a reflexão da sociedade em geral sobre a verdade dos fatos e, em particular, de uma geração de jovens, que tão somente ouviram inverdades ou estudaram em livros tendenciosos por versões falseadas.
O Supremo absolveu o senador das acusações de peculato, corrupção passiva e falsidade ideológica. Collor teria permitido a assinatura de contratos fraudulentos com empresas de publicidade quando era presidente, entre 1990 e 1992. A denúncia do Ministério Público foi recebida na Justiça comum em 2000.
Para Collor, o resultado do julgamento - ele foi absolvido após os crimes que ele foi acusado de ter cometido na Presidência da República terem prescrito - permite que seu governo tenha a história rescrita.
- O resultado, nem sempre reproduzido pelos meios na mesma proporção das notícias precedentes ou com a mesma fidedignidade dos fatos - covardia, isto é, covardia -, veio não apenas me aliviar das angústias que tenho vivenciado nos últimos 23 anos, mas, igualmente, veio reescrever a história do Brasil na parte referente ao período em que exerci, com muito orgulho e honra, pelo voto direto de todos os brasileiros, a Presidência da República Federativa do Brasil - afirmou.
Depois de listar ações que adotou durante seu governo, Collor afirmou que o julgamento significa que ele teve a mais alta corte do país "revisando e ratificando" sua inocência.
- Não é fácil volver os olhos ao passado e reviver em toda a sua extensão a tortura, a angústia e o sofrimento de quem é agredido meses a fio e teve de suportar as agruras de acusações infundadas e a condenação antes mesmo de qualquer julgamento - disse. - Constrangido algumas vezes, contrafeito outras, mas calado sempre, assisti, ouvi e suportei acusações, gestos e incriminações daqueles que, movidos pelo rancor, aceitaram o papel que lhes foi destinado na grande farsa que lhes coube protagonizar.
O caso chegou ao STF em 2007 e ficou parado no gabinete da relatora, a ministra Cármen Lúcia, de 2009 a 2013. A demora para julgar foi tanta que os crimes de corrupção passiva e falsidade já estavam prescritos - portanto, mesmo que houvesse condenação, o réu não poderia ser punido. No julgamento, todos os ministros concordaram que a denúncia do Ministério Público estava mal formulada e não havia prova suficiente no processo para condenar o ex-presidente por nenhum dos três crimes.
O esquema denunciado pelo Ministério Público tinha vários pontos de semelhança com o mensalão do governo Lula, condenado pelo STF. Segundo a denúncia, agências de publicidade eram contratadas por meio de concorrências ilegalmente direcionadas. Em troca do favor, as empresas pagavam propina a assessores diretos do então presidente. Parte do dinheiro desviado teria sido usado para custear a pensão a um filho tido por Collor fora do casamento.