Diário íntimo e memórias de
Sabino de Campos
Fonte: Jornal de Ontem, Hoje e Sempre/Erivaldo
Brito
Na
sua infância, o poeta Sabino de Campos morava na Rua do Moinho, depois
Pitanga de Baixo e atual Augusto Régis. Ele nos conta a amizade que
tinha com um menino apelidado de Lourinho e que, em defesa dele, saiu na
porrada no beco da Santa Casa. Deliciem-se com a narrativa, faça um
encontro com o passado da Cachoeira.
Na sua infância, o poeta Sabino de Campos morava na Rua do Moinho, depois Pitanga de Baixo e atual Augusto Régis. Ele nos conta a amizade que tinha com um menino apelidado de Lourinho e que, em defesa dele, saiu na porrada no beco da Santa Casa. Deliciem-se com a narrativa, faça um encontro com o passado da Cachoeira.
"Até hoje me revolto contra a tirania do mais forte sobre o mais fraco.
Na rua do Moinho, um pouco adiante de nossa casa, morava um menino amarelo, fraco, inofensivo, chamado Lourinho. Eu gostava dele em razão de sua fraqueza e bondade. Acontecia, não raro, encontrarmo-nos na feira que se realizava à sombra dos tamarineiros da praça do chafariz, atual Dr.Aristides Milton.
Eu comprava caranguejos de mar-a-baixo, ostras aferventadas, dispostas em camadas de dez, sobre um retângulo de folhas de bananeira, ao preço de um vintém: molhos de coentro e feijão verde, igualmente de vintém cada, quando vi um rapazote sertanejo, tipo grosso, acaboclado e valentão, de nome Bento, serviçal do Delegado de Polícia Manuel Mendes, esbofeteando o pobre Lourinho, bem no meio da feira.
Não me contive. Deixei as compras à guarda de um feirante, avancei para o agressor,e segurando-o com pulso forte, o convidei a resolver o caso comigo, ali perto no beco da Santa Casa de Misericórdia.
A esse tempo, eu sempre conduzia, escondido por dentro do cós das calças um rebenque de cabo e corrente de prata, utilizado, outrora, por minha mãe, em viagem, a cavalo, montada em selim de banda.
O Bento olhou-me de soslaio e foi, Entramos no beco da Santa Casa. Ele na frente, eu após.
Antes que o temido e troncudo moleque tomasse posição ofensiva, arranquei do rebenque e o couro vibrou-lhe na rara: lhepo! lhepo! lhepo!
Mas eu quase ia levando a pior. Na violência de arrancar o chicote, o cordão que me amarrava as calças arrebentou e elas foram caindo vergonhosamente...
O sertanejo poderia ter aproveitado o incidente e atracar-se comigo, tirando a forra.
Entretanto, no momento exato de as calças caírem, apareceu, providencialmente, uma das mulheres de meu tio, e me separou da luta.
O outro fez uma cruz no chão, jurando vingar-se. Segui com a Eudóxia, amarrando as calças, apanhei as compras e me endireitei para a Pitanga de Baixo.
Já perto de casa, ouvi o vozeiro da meninada: - Sinhô! O bento aí vem como uma bala!
Entrei correndo, joguei as compras na mesa da sala da janta, e, sem que minha mãe visse, agarrei a tranca de uma porta, saí pelo portão dos fundos, e de cima da ribanceira do riacho Pitanga, afluente do rio Paraguaçu, esperei o cabra!
Ele irrompeu entre uma leva de meninos vagabundos. Ao ver-me empunhando a tranca, arrancou um dos varapaus que, com as respectivas cordas, serviam de enxugadouro de roupas das lavadeiras do regato, subiu feroz a ribanceira, e desfechou a madeira sobre mim! Com a tranca, aparei o golpe. O varapau, que estava meio podre, quebrou-se perto das mãos do caboclo.
Agora, quem soube aproveitar o incidente fui eu. Desandei=lhe a tranca no pescoço e o malvado rolou de ribanceira abaixo, caindo arquejante, no riacho!
Corri para o salvar do afogamento.
Forcejava eu para o levantar, eis perto a fábrica de charutos dos alemãs Robert e Rudolph buzinou onze horas do dia e os operários saíram para o almoço.
O gerente Manuel Caetano de Assis, (Tute), irmão do prestigioso deputado federal Dr.Ubaldino de Assis, com alguns operários, homens e mulheres, na suposição de que eu estivera afogando o pobre, acudiram, entrando na água, puxando-me pelas costas e salvando o Bento que, dias depois, se vingava no Lourinho".
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