domingo, 22 de março de 2015

Jornalismo investigativo ante os poderes da corrupção:
corruptos e corrompidos costumam ser muito convincentes e fluentes

Por Pedro Borges dos Anjos
Editor-Chefe do Jornal O Guarany

 
A comprovação de desvios de recursos e corrupção é um dos trabalhos jornalísticos mais delicados. Se um político ou ministro for flagrado numa mentira ou contradição, sua carreira pode até sofrer abalos, mas não termina. Provado que desviou recursos para seu enriquecimento, ele pode até não ser punido pela polícia ou julgado pela Justiça, mas sua carreira estará seriamente comprometida. Por isso as falcatruas são, em geral, sofisticadas, e seus mentores não costumam deixar rastros. Suponha-se que um funcionário público auxilie na aprovação de uma obra desnecessária. O dinheiro clandestino recebido pela “ajuda” não será depositado em sua conta-corrente, mas usado como fachada um parente ou amigo. Ou até mesmo, como é freqüente, o depósito vai para conta no exterior. Quem pagou a propina não confessa, pois também estaria incorrendo em crime. Denunciar a obra supostamente desnecessária significa entrara numa discussão não penal, mas administrativa, e os acusados sempre disporão de bons argumentos técnicos para justificar um desperdício com dinheiro público, capaz até mesmo de embaralhar a convicção dos jornalistas. Os picaretas costumam ser muito convincentes e fluentes.

O desvio de dinheiro público já vem de muito tempo:
O jornalismo investigativo, conforme registra o jornalista Gilberto Dimenstein, em seu esclarecido opúsculo “Armadilhas do Poder – Bastidores da Imprensa”, ele conta que é um nítido absurdo dispensar de licitação a escolha de empreiteiras, como ocorreu no projeto S.O.S. Rodovias, no governo Collor, com o custo calculado em US$500 milhões de dólares. As suspeitas eram tão inevitáveis como imediatas. Mas o então secretário dos Transportes, Marcelo Ribeiro, sustentou a medida, alegando que as estradas brasileiras estavam em péssima condição, provocando inclusive mortes, o que era verdade. Assim, as obras de melhoria eram urgentes – foi a base da argumentação do parecer do renomado juristas, o saudoso Prof. Hely Lopes Meirelles, especialista em Direito Administrativo.

O encadeamento dos fatos provoca, por si só, as suspeitas. Antes de assumir a pasta dos Transportes, Marcelo Ribeiro era diretor de uma empreiteira, a Tratex. Chegou ao cargo pelas mãos do caixa da campanha à Presidência, o empresário Paulo César Cavalcanti Farias, que arrecadava dinheiro às escondidas durante a campanha. Detalhe: Paulo Cesar já era conhecido como ilustre integrante da “lista negra” do Banco Central, apontado como envolvido em fraudes com incentivos fiscais.

O ilícito da dispensa de licitação estaria de fato comprovado se documentos ou testemunhas indicassem que as empreiteiras deram dinheiro para a campanha de Collor, e, agora, estavam cobrando, através de obras como a melhoria das estradas federais. Nada fácil – mesmo porque dinheiro em campanha ia para fundos ao portador, que não exigem identificação.

Quem acompanha os bastidores do poder sabe que as empreiteiras fazem acertos antecipados, fraudando concorrências. Reúnem-se as empresas e distribuem as obras públicas que vão realizar pelo país – a partir daí, estabelecem os preços que vão apresentar nas licitações. Tarefa árdua provar esse acerto, proibido por lei. Mas a imprensa  investigativa tem conseguido superar as dificuldades, razão por que  vem desconstruindo o império da corrupção, conforme ocorreu com os anãos do orçamento, o mensalão e mais recente com a Petrobrás, e tantas outros focos de desvio de dinheiro público, Brasil a fora,  com que tem gerado sucessivas operações da Polícia Federal.



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