CRÔNICA: JUSTIÇA SEJA FEITA
Por Erivaldo Brito
Ia passando distraidamente por uma das ruas mais movimentadas da minha terra quando ouvi uma voz familiar me chamar: - Erivaldo Brito! Respondi com um aceno de mão enquanto para lá me dirigia. Cumprimentei-o: - Diga aê Tonho Bezerro! E ele, já acostumado com a minha brincadeira de costume: - Bezerra seu Erivaldo Brito, Bezerra! Sai cumprimentando a cada um dos presentes que estavam no seu salão de barbeiro que originalmente se chamava Salão Glória, de Ananias Aragão, e depois Edvaldo Chaves, Vadinho. Ali no Salão Glória de Ananias, trabalhavam com ele mais três irmãos. Um deles, inclusive, quando tomava umas duas, cantava nas noites da Cachoeira imitando o vozeirão de Vicente Celestino. Eram todos castroalvenses. Aliás, e a propósito, quando eu me entendi como gente, na minha cidade havia muitas famílias oriundas da cidade de Castro Alves, como a família Sales Ribeiro (Adaucto, Aurelino, Carlos, Maé, Teté e Divaldo), Lourival Melo e Erudilho Bastos (Morenito), dos que estou a lembrar no momento. Foi, sem qualquer sombra de dúvida, um êxodo benfazejo para a sociedade cachoeirana.
Dentro do Salão de Tonho Bezerra (como é mais conhecido, atualmente), encontrei-me com o velho amigo Valter Evangelista da Silva, o aposentado “Garrafinha”, antigo fotógrafo dos eventos sociais da cidade. Depois de abraçá-lo, eu que tenho uma verdadeira ojeriza ao silêncio covarde da história, toquei num assunto delicado, perguntando-o se ele havia sido indenizado por ter sido preso arbitrariamente pela ditadura militar na década de sessenta. Ele respondeu-me com certo ar de espanto: - É, rapaz, tinha direito, né?! E eu respondi: - Tinha, não. Tem! E mostrou-se interessado quando eu o informei que, até as famílias dos que já faleceram tinham direito, desde que a Justiça fosse motivada a fazê-lo. Ficar esperando na bandeja, (velho costume de grande parte dos meus conterrâneos, infelizmente), nada vai acontecer. Sem qualquer pretensão de envolver-me no mérito da questão ideológica, fui testemunha ocular de várias prisões arbitrárias, sem qualquer mandado judicial, de vários cidadãos de bem da comunidade, humilhados diante da família e da sociedade, a saber: Abílio Figueiredo, Ananias Aragão, Antonio Rodrigo de Oliveira Passos, Adolpho Gottschall da Silva, Aloísio Nunes, Elias Cardoso de Jesus, Luiz Raposo, Lourival Alves, Paulino Batista Reis, Stênio Henrique de Burgos e Valter Evangelista da Silva, dos que estou a lembrar, no momento. Ninguém tinha notícia do que iria acontecer com eles. Os boatos eram alarmantes. Depois que eles retornaram nenhum dos que foram presos fizeram acusações sobre fulano, beltrano ou cicrano que foram responsáveis pela delação. Silêncio total, se bem que, com o passar dos tempos, ficou clara e notória que eles, no mínimo, sofreram a tortura mental dos demais presos políticos do Brasil afora naqueles tempos hoje conhecidos como “anos de chumbo”. Os que sofreram a humilhação da prisão arbitrária, com certeza não possuem boas lembranças nem saudade alguma.
O processo de pedido de indenização, conforme disse a Valter, pode ser feito pelo próprio ofendido numa carta relatando a tortura física e moral sofrida, e deve ser endereçada a Comissão da Verdade (funciona numa sala do Centro Cultural do Banco do Brasil, em Brasília), ou então através de algum advogado (no mínimo dois operadores de Direito possuem familiares envolvidos), com pedidos de Habeas Data e apuração por parte do Ministério Público. Aquele triste episódio não deve envergonhar nenhum familiar dos envolvidos, mesmo porque alguns não tinham participação política qualquer, outros se opunham ao regime por serem nacionalista e legalista (pró Jango), ou por terem sofrido durante a ditadura Vargas. Devemos rememorar, sim, aqueles fatos, porque esquecer erros é varrer o lixo pra debaixo do tapete, com a possibilidade latente de que tudo volte a acontecer novamente.
Dentro do Salão de Tonho Bezerra (como é mais conhecido, atualmente), encontrei-me com o velho amigo Valter Evangelista da Silva, o aposentado “Garrafinha”, antigo fotógrafo dos eventos sociais da cidade. Depois de abraçá-lo, eu que tenho uma verdadeira ojeriza ao silêncio covarde da história, toquei num assunto delicado, perguntando-o se ele havia sido indenizado por ter sido preso arbitrariamente pela ditadura militar na década de sessenta. Ele respondeu-me com certo ar de espanto: - É, rapaz, tinha direito, né?! E eu respondi: - Tinha, não. Tem! E mostrou-se interessado quando eu o informei que, até as famílias dos que já faleceram tinham direito, desde que a Justiça fosse motivada a fazê-lo. Ficar esperando na bandeja, (velho costume de grande parte dos meus conterrâneos, infelizmente), nada vai acontecer. Sem qualquer pretensão de envolver-me no mérito da questão ideológica, fui testemunha ocular de várias prisões arbitrárias, sem qualquer mandado judicial, de vários cidadãos de bem da comunidade, humilhados diante da família e da sociedade, a saber: Abílio Figueiredo, Ananias Aragão, Antonio Rodrigo de Oliveira Passos, Adolpho Gottschall da Silva, Aloísio Nunes, Elias Cardoso de Jesus, Luiz Raposo, Lourival Alves, Paulino Batista Reis, Stênio Henrique de Burgos e Valter Evangelista da Silva, dos que estou a lembrar, no momento. Ninguém tinha notícia do que iria acontecer com eles. Os boatos eram alarmantes. Depois que eles retornaram nenhum dos que foram presos fizeram acusações sobre fulano, beltrano ou cicrano que foram responsáveis pela delação. Silêncio total, se bem que, com o passar dos tempos, ficou clara e notória que eles, no mínimo, sofreram a tortura mental dos demais presos políticos do Brasil afora naqueles tempos hoje conhecidos como “anos de chumbo”. Os que sofreram a humilhação da prisão arbitrária, com certeza não possuem boas lembranças nem saudade alguma.
O processo de pedido de indenização, conforme disse a Valter, pode ser feito pelo próprio ofendido numa carta relatando a tortura física e moral sofrida, e deve ser endereçada a Comissão da Verdade (funciona numa sala do Centro Cultural do Banco do Brasil, em Brasília), ou então através de algum advogado (no mínimo dois operadores de Direito possuem familiares envolvidos), com pedidos de Habeas Data e apuração por parte do Ministério Público. Aquele triste episódio não deve envergonhar nenhum familiar dos envolvidos, mesmo porque alguns não tinham participação política qualquer, outros se opunham ao regime por serem nacionalista e legalista (pró Jango), ou por terem sofrido durante a ditadura Vargas. Devemos rememorar, sim, aqueles fatos, porque esquecer erros é varrer o lixo pra debaixo do tapete, com a possibilidade latente de que tudo volte a acontecer novamente.
*Erivaldo Brito é advogado, cachoeirano de família tradicional, radicado na cidade do Rio de Janeiro/RJ
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