domingo, 7 de agosto de 2016

EM CACHOEIRA/BAHIA






A Festa da Irmandade Boa Morte



Revestida de mistérios, entre muitos, a cidade histórica da Cachoeira tem na secular Irmandade da Boa Morte, a sua maior expressão de fé no culto aos orixás. Senhoras, que integram a linhagem da ancestralidade africana,  guardam a cultura e fé do seu povo, sem quaisquer alterações, com que se qualificaram para integrar o quadro da mais famosa Irmandade do território nacional – a Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte.

Embora cerimônias antecedam e sucedam os dias de maior movimentação, as datas de 13,14 e 15 de agosto de cada ano são destinados a solenidades públicas com as quais as irmãs prestam culto a Nossa Senhora, trajando indumentárias apropriadas a cada formalidade, como luto, na morte; vestes que retratam tristeza, no velório, e vestimentas com cores que expressam alegria, na ressurreição.
A historiografia dessas notáveis mulheres cachoeiranas continua a desafiar a inteligência de jovens pesquisadores. Seus rituais secretos ligados ao culto dos orixás também estão a requerer leitura etnográfica que respeite, naturalmente, os limites à manutenção dos segredos, tão importantes na preservação  dessa vertente religiosa. O que tem ressaltado é o aspecto externo do culto referido  quase  todo  ao simbolismo católico e  a sua apropriação afro-brasileira. Durante o começo do mês de agosto, uma longa programação pública atrai a Cachoeira gente de todos os lugares, no que Moraes Ribeiro, pesquisador e iniciado no culto aos orixás, considera o mais representativo documento vivo da religiosidade brasileira, barroca, ibero-africana. Ceias, cortejos, missas, procissões, samba-de-roda colocam cerca de 30 remanescentes da Irmandade, que já possuiu mais de 200 membros, no centro dos acontecimentos da  cidade histórica da Cachoeira, e, ultimamente, nos principais órgãos noticiosos da capital e tele-jornais de alcance nacional e internacional. 

A festa propriamente dita tem um calendário que inclui a confissão dos membros na Igreja Matriz, cortejo representando o falecimento de Nossa Senhora,  sentinela,  seguida de ceia branca, composta de pão, vinhos e frutos do mar, obedecendo a costumes religiosos que interditam o acesso a dendê e carne na sexta-feira, dia dedicado a Oxalá, criador do Universo, e procissão do enterro de Nossa Senhora da Boa Morte, onde as irmãs usam trajes de gala. A celebração da assunção de Nossa Senhora da Glória aos céus, seguida de procissão, em missa realizada em seu Templo, na sede da Irmandade, dá curso à contagiante alegria dos cachoeiranos,  turistas nacionais e estrangeiros, os quais, inseparavelmente unidos, irrompem em plenitude, nas cores, comida e bastante música e dança que se prolongam por diversos dias, que sucedem à procissão da glória.

Antes, sem sede, sem divulgação, a Festa da Boa Morte se limitava, a ações religiosas de simples expressão. No final da administração do saudoso ex-prefeito Geraldo Simões, o Prof. Pedro Borges, amigo pessoal das saudosas Irmãs Estelita, juíza perpétua; de Ernestina e Anália da Paz, com as quais pode se informar com maior profundidade sobre o culto da Boa Morte aos orixás, produziu em língua Inglesa amplo documento expondo a declaração de princípios da Irmandade, e sua estrutura, e, procedeu à sua divulgação em agências de viagens em New York e Washington DC,  e pôde fazer oficialmente, tendo em vista que no período era o titular do Departamento Municipal de Cultura de Turismo da Cachoeira, (atual secretaria de Turismo e Cultura). A partir da referida divulgação, estudiosos, acadêmicos, turistas nacionais e estrangeiros, notadamente, norte-americanos, procedentes da Georgia e de Washington, a capital dos Estados Unidos, visitam a cidade e participam ativamente da Festa da Boa Morte, lotando hotéis e pousadas, durante todo o período das solenidades. Nos meses que antecedem à secular Festa, turistas, principalmente, dos Estados Unidos, costumam vir à Cachoeira para conhecer mais de perto a Irmandade da Boa Morte.  Foi assim que no período em que era comandada pelas saudosas irmãs mencionadas, a Irmandade da Boa Morte recebeu oficialmente visitas de destacados membros da sociedade norte-americana, a exemplo da advogada DeLois Steveson, de Washington D.C.; da pastora evangélica Barbara King, da Geórgia; e de tantos outros acadêmicos, interessados na preservação da cultura e da  fé de seus ancestrais, no modelo autêntico instruído e preservado pela Irmandade da Boa Morte.  Fizeram doações de monta considerável, influenciaram para que o governo do Estado destinasse recursos para compra, restauração e requalificação do conjunto de imóveis, hoje, a sede da Irmandade. Patrocinadas integralmente pela pastora Barbara King, as saudosas irmãs Analia da Paz e Ernestina foram aos Estados Unidos com o objetivo de ministrarem técnicas de confecção de indumentárias e da culinária afro, numa comunidade da Georgia liderada pela mencionada pastora.


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