DESTRUINDO A CULTURA
Antonio Lins*
Um conjunto arquitetônico da Bahia colonial, de grande relevância cultural,
acaba de ser demolido. Precisamente 12 construções do século XIX, situadas na
lendária Ladeira da Montanha, além de outras tantas na Ladeira da Conceição,
todas tombados pelo IPHAN, que nada faz, de concreto, para conter tal
degradação.
Quando estive à frente da Fundação Gregório de Mattos, em 2008,
elaborei, juntamente com o arquiteto Juca Gonçalves, projeto que representava
uma oportunidade para reestruturar o centro histórico da cidade, por parte do
Governo municipal, em parceria com a União.
A prefeitura capitanearia uma ação fundamental para a cidade, devolvendo
a centralidade legítima, à dignidade e a beleza que foram perdidas pelo Centro
antigo. Pretendia mobilizar o imaginário convocante da cidade, consolidando o
centro como um grande espaço cultural de Salvador. O seu complexo cultural conjugaria interesses
econômicos, políticos e sociais por um viés cultural, lastreado em um
pensamento arquitetônico e urbanístico aprofundado, que projetaria suas
relações com a cidade, seria seu novo cartão postal, sua
marca indelével. O projeto propunha um conjunto de intervenções que atrairia investimentos,
geração de renda e empregos, trazendo aumento de arrecadação, e gerando um
círculo virtuoso relativo à recuperação cultural e sócio-imobiliário-urbanístico
daquele trecho fundador da cidade da
Bahia.
Salvador é uma cidade caracterizada por sua especificidade cultural,
resultado da combinação entre os modos
de ser de sua gente e a implantação de seu extraordinário patrimônio
arquitetônico, artístico e natural. A requalificação sustentável de seu
patrimônio histórico é central para qualquer propósito de desenvolvimento da
cidade e sua destinação.
As intervenções proposta no projeto estão localizadas na área central da
cidade, entre a parte alta e baixa e compõem um conjunto de ações que seriam
implementadas pela Prefeitura, em parceria com a iniciativa privada e a
participação da comunidade.
O projeto gravitaria em torno de dois eixos, que seriam os seus
principais equipamentos culturais: Fórum Cultural e de Negócios, Museu da
Imagem e do Som, e o Centro de Convenções e Eventos Culturais, espaço multiuso
que permitiria a realização dos mais variados eventos. Estratégico para a rede
hoteleira que pretendia implantar-se no entorno. Situado na parte superior da
encosta, a proposta integraria dois estacionamentos subterrâneos, sendo um com
acesso pela parte baixa da Ladeira da Preguiça e outro, com acesso na
confluência da ladeira da Montanha e Rua Carlos Gomes. Suas principais
vantagens seriam melhorar a acessibilidade e mobilidade urbana e estimular o
comércio local, além de vir responder a uma grave lacuna, a inexistência de um
equipamento cultural que contasse a história da cidade do Salvador.
O Museu da Cidade seria um novo equipamento que abrigaria o Arquivo Histórico
Municipal, atualmente degradado no fundo do poço de um velho prédio na Rua
Chile, onde está situada a Fundação Gregório de Mattos.
O Museu seria a memória visual da civilização baiana. Com maquetes e
ênfase em uma expografia que privilegiasse a informação, com recursos
eletrônicos e digitais; um mergulho na história da cidade, em seus mais variados
aspectos. Seria concebido como um dinâmico centro de conhecimento e saber; uma
permanente reflexão sobre o passado como maneira de pensar o presente e
desenhar cenários do futuro.
Parte dos velhos, abandonados e degradados casarios, seriam recuperados,
e deveriam fazer parte de um conjunto de atividades culturais, paralelamente a
outras atividades de serviços e comércio.
É preciso que os nossos governantes, compreendam que a par de sua importância
identidária, a cultura representa 7% do
nosso PIB.
Salvemos, pois, Salvador, urgentemente, antes que o tsunami da mediocridade
acabe com o pouco que ainda resta da velha e barroca cidade dos nossos antepassados.
*Antonio Lins, poeta, dramaturgo e jornalista
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