terça-feira, 25 de novembro de 2014

ENTREVISTA



Concedida ao Jornalista Baggio Talento
Houve absurda compra de votos, diz a ministra Eliana Calmon


A ministra Eliana Calmon, candidata derrotada do PSB ao Senado, que obteve 70 mil votos a mais que Lídice da Mata, candidata ao governo do Estado pela mesma legenda, acredita que a política do Brasil vai mudar após a Operação Lava-Jato, e as máquinas de compra de votos, que ela disse ter existido este ano, devem ser desativadas.

Ministra, antes de tratar de política, gostaria de ouvir a senhora sobre dois juízes que tem se destacado nacionalmente, um pelo aspecto negativo e outro pelo positivo. Primeiro, o juiz João Carlos de Souza Corrêa, que processou uma servidora carioca por multá-lo e dizer que ele não era Deus. A senhora já o investigou como corregedora do Conselho Nacional de Justiça?
Quando cheguei à Corregedoria já encontrei uma denúncia contra ele que foi o estopim de tudo, exatamente o fato dele estar dirigindo sem carteira de motorista, o carro sem placa, o que deu origem a busca e apreensão do veículo e que levou essa moça (a agente de trânsito Luciana Silva Tamburini) a ser condenada. A partir daí, várias pessoas começaram a procurar para dar informações sobre o juiz, como um péssimo elemento. Aumentaram as queixas, a Corregedoria o estava investigando. As novas denúncias foram todas apuradas por mim.

 
Quais foram?
Por exemplo, ele não pagava a frutaria, a delicatessen da cidade de Angra (de sua comarca). Morava em um hotel e também não pagava. Havia também o envolvimento dele com questões de terra, mas isso ai não chegamos a ter provas concretas. Foram indícios que começaram a ser investigados. Eram muitos fatos e esses fatos demoraram a ser apurados, não cheguei ao fim dessa apuração, pois começaram em 2011 e eu sai da Corregedoria em 2012. Mas já deixei um processo disciplinar bastante volumoso, com diversas denúncias.


Ele a procurou para rebater as denúncias?
Sim. Foi com a mulher. Não gostei da postura dele. O achei muito arrogante. Chegava muita coisa contra ele e eu pensava: não é possível que aquilo tudo seja mentira.


O caso dele é abuso de poder?
Exatamente. Abuso de poder, muita prepotência e existe também denúncias de corrupção na área de cartórios. Agora, ele é muito ligado ao desembargador Luiz Zveiter que é o todo poderoso no Rio de Janeiro. Quem dá toda cobertura a ele é o Luiz Zveiter.

Isso explica o fato dele nunca ter sido punido no Rio.
Luiz Zveiter é muito poderoso e o poder maior dele (contra o qual eu abri sete processos disciplinares), vem de diversas situações. Ele é rico, o pai dele é Grão Mestre da Maçonaria, tem um grande escritório de advocacia e esse escritório, inclusive, é quem faz a advocacia da Rede Globo.


O outro personagem, desta vez positivo, é o juiz Sérgio Moro, que comanda o processo da Operação Lava Jato. De onde a senhora o conhece?
Ele era assessor da Ministra Rosa Weber (do Supremo Tribunal Federal) por ocasião do tempo que eu era Corregedora do CNJ. Passei a conhecê-lo mais de perto porque os juízes auxiliares da Corregedoria eram contemporâneos dele. E, às vazes, saíamos todos para almoçar. Ele é tido pelos colegas como um juiz exemplar. Estamos vendo isso agora. É um moço de bem, maduro, correto.


Ele é dessa escola de juízes como a senhora e o ministro Joaquim Barbosa que realmente levam o combate à corrupção a sério, não se intimidam.
Sim. Ele se especializou, fora do Brasil, para assumir uma das varas federais de lavagem de dinheiro, que a Corregedoria fez no tempo do ministro-corregedor Gilson Dipp. Então, esses contatos com o Coaf, Banco Central, CGU, tudo isso faz parte da nova escola da Magistratura que eu estava imbuída e quis fazer na Corregedoria. Não se esqueça que o grande problema que se deu comigo foi porque os juízes não aceitavam que a magistratura estivesse sobre a fiscalização do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão do Ministério da Fazenda). Agora, a Coaf se apresenta como importante veículo de combate à corrupção.


Entrando agora na política. Após as eleições a senhora se referiu a donos de partidos no PSB e na Rede na Bahia. Isso vai balizar uma decisão da senhora em relação ao seu futuro na política?
Sem dúvida. Na realidade, hoje, as pessoas ficam temerosas de terem nos partidos companheiros que pensem, que dê opinião, que falem. Sou uma pessoa que fala. Denuncio, digo o que está errado, o que está certo. Dentro do esquema dos partidos sou uma pessoa incômoda. Os partidos são, vamos dizer assim, empresas pequenas, onde três ou quatro dominam e as outras dizem amém. Eles querem pessoas acessíveis, que aceitem as normas. Não quem se rebela.


Em função disso, qual será o caminho da senhora?
Estou nos dois partidos (PSB e Rede). Fui colocada em nível nacional. Quem me levou para o PSB foi (o falecido ex-governador) Eduardo Campos. E na Rede entrei pelas mãos de Marina Silva, que é uma amiga minha. Estou em Brasília, onde passarei 15 dias, para conversar com ela, calmamente, sobre o futuro da Rede, como também conversarei com o Carlos Siqueira, que é o presidente nacional do PSB. A partir dessa conversa, eu vou me posicionar. Também não quero criar conflito com ninguém. Com esses políticos profissionais, que atravessaram a vida como políticos, não vou absolutamente criar problemas. Agora, creio que o quadro partidário vai mudar muito ano que vem. Não vamos continuar como estamos. Da onde é que vem o baixo nível dos políticos? Vem exatamente da postura dos partidos. Você não tem nome que represente novidade, de consistência, de envergadura moral, intelectual na Bahia. Não tem por quê? Será que a Bahia não tem gente nova? Não tem porque dentro desse esquema, ninguém quer, ninguém chega.
Essa primeira campanha para o Senado colocou a senhora a par da realidade dos partidos... Foi a minha grande descoberta. Eu observei como as coisas se comportam. Por que na Bahia ocorre isso? Porque não existe incentivo para os novos nomes na política. Pelo contrário.

Então, uma definição só depois dessas conversas em Brasília?
Isso. Só vejo dizer: "Não, o PSB quer se reorganizar". Reorganizar como, dentro do mesmo diapasão, com as mesmas pessoas? Se as pessoas atravessaram suas vidas dentro desse esquema, não vão querer melhorar a política. Quem é o grande da Rede na Bahia? Não tem. São pessoas que se deram mal nos outros partidos, principalmente o PT, correu para a Rede.


A senhora já declarou também que a senadora Lídice da Mata, candidata a governadora pelo PSB, foi mais petista que socialista na campanha...
Nunca foi diferente. Mas é coerência. Ela tem afetos, é ligadíssima à família (do governador) Jaques Wagner, ao (secretário José Sérgio) Gabrielli, que é compadre dela. Isso não se desfaz de uma hora para a outra. O rompimento de Eduardo Campos com o PT foi político, mas que não o levou a outros rompimentos. Era preciso ser muito político profissional para separar afetos pessoais de interesses políticos. E isso, com a formação latina que temos, é muito difícil.


Na campanha deste ano se falou muito em compra de votos pelo interior. A senhora recebeu alguma proposta nesse sentido?
Algumas pessoas foram oferecer. Mas é assim: "Olha eu tenho dois mil votos e custa tanto". Isso ocorreu. Tenho um amigo político em Teixeira de Freitas que me disse. "Olha doutora Eliana, eu passei a admirar a senhora quando um cabo eleitoral chegou e disse que tinha três mil votos que custava tanto e a senhora respondeu: esses votos não me interessam. Eu quero votos espontâneos". Acho que tive muitos votos, mais de meio milhão, mas o que digo é o seguinte: esses votos foram conscientes ou incentivados por pessoas que me conheciam e davam depoimento. Não teve voto de cabo eleitoral, comprado. O que prova que o povo quer mudança, quer seriedade. Estou numa situação muito cômoda para ser a terceira via. Em primeiro lugar não tenho os pecados originais, como não sou política, não tenho rabo de palha; segundo, tenho a vantagem de ter a minha aposentadoria (como ministra) e não ter problemas financeiros, não preciso de partido para sobreviver, não quero um emprego; em terceiro lugar tenho um nome já formado fora da política.


A senhora pretende, então disputar a próxima eleição municipal?
Na campanha eu dizia. Se Aécio Neves (PSDB) ganhar a eleição, vamos continuar a polarização (com o PT) e aí eu tenho condições de continuar sendo uma terceira via. Mas se Dilma Rousseff vencer não existirá mais a polarização. Isso, porque, na minha concepção, houve uma compra de votos de tal magnitude, um uso da máquina governamental de tal monta que não sobrou espaço para uma terceira via porque tudo virou comércio. Então, qualquer pessoa que entrar na política será esmagada por essa máquina do mal, porque ninguém desconhece que houve um absurdo de compra de votos e aparelhamento do Estado.


Uma reforma política não seria uma solução?
Acho que o modelo se esgotou. O que aconteceu nessas eleições possivelmente não acontecerá nas próximas. Pois tudo isso que se está vendo de apuração na Petrobras (na operação Lava-Jato) e já se encaminha para outras áreas como Correios, em Eletrobras, vai fazer com que o Brasil entre um novo ciclo. Vai acabar renovando a política à força. Que não será mais a força de aparelhamento do PT, pois como está não tem condições de alguém vencer a eleição. O prefeitos estão de pires na mão. O governo federal diminuiu os recursos do Fundo de Participação dos Municípios e deram mais encargos aos prefeitos e eles, para sobreviver, precisam fazer alianças. Ninguém liga para a infidelidade partidária. O PSB tem 32 prefeitos na Bahia. Somente dois foram ostensivamente para o lado de Lídice. Os outros ficaram com o PT. E o PSB não fez nada.




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