Os EUA estão mais isolados do que nunca na possível decisão de bombardear a Síria.
Na tarde deste domingo, em Paris, o ministro francês do Interior,
Manuel Valls, durante entrevista à Rádio Europa 1, afirmou que “se o
Conselho de Segurança (das Nações Unidas) não está em condições de tomar
uma decisão acerca de um ataque à Síria, uma coalizão deverá ser
formada, mas de forma mais ampla possível”. Segundo o ministro, o
“presidente François Hollande se mantém firme” no apoio de uma ação
armada na Síria, mas reconhece que “se levarmos em conta os
gastos e meios requeridos para uma intervenção, a França preciará
esperar a decisão norte-americana”.
– De forma alguma a França atuará sozinha em relação à Síria – afirmou.
Em linha com a decisão da China de “jamais apoiar um ataque dos EUA à
Síria”, segundo afirma a chancelaria daquele país, a Rússia tem
mobilizado tropas tanto na direção de Damasco quanto da Arábia Saudita.
Caso haja o pedido formal da Síria para que os russos tomem posição de
batalha contra os invasores, “serão plenamente atendidos”, afirmou uma
fonte militar de Moscou.
Ainda neste domingo, um alto líder da milícia xiita Hezbolá se reuniu
con o presidente do Líbano, Michel Suleiman, para tratar da crise na
Siria e definir qual será a reação dos libaneses caso o presidente
norte-americano, Barack Obama, autorize o ataque com mísseis à nação
árabe vizinha. Segundo o repórter William Parra, enviado especial da
rede latino-americana de TV TeleSur a Beirute, o Hezbolá está em estado
de alerta diante das ameaças do Ocidente.
Em caso de ataque, a Síria lançará seus mísseis na direção dos
territórios ocupados da Palestina, em alvos pré-determinados no Estado
de Israel, segundo a agência libanesa de notícias Al-Hadath, citando
fonte militar síria. Segundo o tenente coronel Ali Ahmad, “o regime de
Tel Aviv sabe muito bem que os mísseis sírios tem alcance para atingir
alvos em Israel e causar uma grande destruição”, no caso de uma
intervenção militar norte-americana. Segundo a fonte militar citada, “a
decisão de iniciar uma guerra equivale ao inferno, por chegaria
rapidamente às principais capitais ocidentais”.
Plano antigo
Ao anunciar, na véspera, que autorizaria uma intervenção militar na
Síria, o presidente Barack Obam, colocou em prática um plano antigo de
seu país. A ideia de uma ação do gênero contra o governo do presidente
Bashar Al Assad já tinha sido planejada durante o mandato de George W.
Bush, ainda em 2006, conforme mostram documentos vazados pelo site
Wikileaks. Segundo o telegrama datado de 13 de dezembro de 2006,
redigido pelo diplomata William Roebuck, “o regime sírio terminava 2006
mais forte domesticamente do que em dezembro de 2005”. Para o diplomata,
o governo Assad era sustentado por uma pequena “claque”, imune às
pressões externas e internas sofridas pelo líder sírio.
Porém, “a crescente confiança de Assad e o apoio desse pequeno grupo
de poder poderiam levar o mandatário sírio a fazer más avaliações e
cometer erros por conta das reações emocionais diante de desafios”. O
diplomata cita o assassinato do ex-premiê libanês Hariri e a criação da
Frente de Salvação Nacional como exemplos da reação irracional de Assad
diante das crises. Segundo Roebuck, essa instabilidade emocional de
Assad deveria ser explorada pelos EUA.
Assad demonstrava preocupação em como era percebido no exterior e se
havia confiança no seu processo de tomada de decisões. Para os
diplomatas norte-americanos sediados em Damasco, as fraquezas de Assad
residiam em como o líder sírio lidava com ameaças iminentes – fossem
elas hipotéticas ou reais. Entre essas ameaças, estavam o conflito entre
as reformas econômicas e a corrupção, a questão curda e o
relacionamento com os radicais islâmicos no país.
De acordo com os diplomatas, havia uma oportunidade para explorar
essas fragilidades de Assad e, assim, conseguir influenciar o círculo ao
redor do mandatário sírio. A ideia era reverter o cenário da época:
economia relativamente estável, oposição fraca e intimidada, e um
cenário regional do Oriente Médio condizente com os interesses da Síria.
O principal foco das ações para desestabilizar a presidência de Assad
envolviam as tensões entre a Síria e o Líbano, “a inexperiência de Assad
e o fato de que o círculo de pessoas de confiança do ditador sírio era
muito pequeno”.
O envolvimento da Síria no assassinato de Hariri e o constrangimento
internacional causado pelo caso colocavam a reputação do país em
questão. A divergência dentro do governo Assad sobre qual a melhor forma
de influenciar o Líbano e o caso Hariri deveriam ser a principal
instabilidade a ser explorada seja pela diplomacia ou por “outros meios
indiretos” O relatório Mehlis, conduzido pela ONU e que acusava a Síria
de ter atrapalhado as investigações do caso Hariri, “causava angústia em
Assad”.
Roebuck também menciona a aproximação de Assad com o Irã e como isso
seria percebido dentro do mundo árabe como uma vulnerabilidade a ser
explorada. “Assad caminha numa linha fina ao se aproximar do Irã sem que
isso feche as portas para o relacionamento com outros vizinhos
sunitas”, explica Roebuck. Os EUA deveriam explorar o medo sunita da
crescente influência iraniana e xiita na Síria. O diplomata recomenda um
“esforço coordenado com os governos de Arábia Saudita e Egito” para
enfraquecer os xiitas e Assad.
O sectarismo e a corrupção são outras das brechas enxergadas por
Roebuck para derrubar Assad do poder. Segundo a avaliação
norte-americana, o poder é dominado pela família Assad e, em menor grau,
pelos Makhluf, clã materno do presidente. As discussões sobre corrupção
e suborno fazem com que a família Assad não seja imune a conspirações
contra o governo. “Várias pessoas íntimas do regime cogitam como seria a
Síria pós-Bashar Assad”, afirma o diplomata norte-americano”.
Ou seja, a ideia da diplomacia norte-americana era impor sanções e
assim explorar a “lavagem de roupa suja dentro do regime Assad”. Segundo
Roebuck, a Frente Nacional de Salvação da Síria sabia onde estavam os
“esqueletos do armário” de Assad. Apoiar a FNS ajudaria a divulgar a
corrupção e causar fissuras no governo sírio.
Também seria explorada a ideia de que a Síria estaria sendo usada
como base para ação de grupos terroristas como a Al Qaeda. No entanto,
até mesmo o governo sírio
se considera vítima desses grupos. Esse argumento deveria ser usado
para demonstrar a instabilidade dentro da Síria. Assad sobreviveu quase 7
anos a essas “instabilidades”. Barack Obama parece empenhado em ajudar
na sua queda a partir de agora.
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