
Em memória do saudoso deputado Pirinho
No dia 12 de janeiro de 1991, há 22
anos, a completar depois de amanhã, morreu de
repente, aos 60 anos de idade, o ex-deputado Pirinho, o Dr. Raimundo Rocha
Pires, influente político da Cachoeira e São Félix. O último filho legítimo
desta terra a representá-la oficialmente junto ao governo da Bahia, como
deputado estadual, em cinco legislaturas. Foi defensor intransigente das ações
do governo que contemplassem o crescimento econômico da região. Constituiu e
liderou, tanto em São Félix como em Cachoeira, os mais influentes e fortes
grupos políticos destes dois municípios, com que elegeu prefeitos e vereadores por
diversos e sucessivos mandatos.
Com o
desaparecimento de Pirinho, os municípios da Cachoeira e São Félix passaram a
ser representados por parlamentares estranhos, de outras localidades, sem
quaisquer vínculos capazes de igualar aos sentimentos de afetividade e
conhecimento dos diversos segmentos que integram as referidas comunidades, vividos
por um filho legítimo e reconhecidamente qualificado para representar os
interesses maiores da população nas esferas mais altas dos Poderes. Faleceu
inesperadamente, em sua residência em Salvador, prestes a completar 60 anos de
idade. Sem qualquer enfermidade aparente, em plena atividade, Pirinho foi
acometido de um mal instantâneo que o levou a óbito em menos de 3
minutos.
Com ele,
Cachoeira e São Félix foram
representadas legitimamente nos altos escalões do governo e na
Assembléia Legislativa da Bahia, em mandatos sucessivos.
Até hoje,
nenhum filho de São Félix ou da Cachoeira, revelou perfil e disposição para prosseguir a
representatividade política exercida pelo seu saudoso deputado Pirinho, embora
ambas as comunidades clamem por um dos valores da própria terra para elegê-lo
deputado estadual a fim de assegurar a continuidade da representatividade
legítima, interrompida há 22 anos.
A
contagiante presença do ilustre e saudoso deputado Pirinho, o seu exemplo, o
seu caráter, seus valores, permanecem vivos na memória de quantos o conheceram, privavam de sua amizade e integravam
o seu amplo quadro de amigos e correligionários. Entre muitos, eu me incluo. Éramos comprades. Ele batizou minha primeira filha, Claudia.
Semelhante ao escritor e jornalista Erivaldo de Souza Brito, que lá da cidade do Rio de Janeiro, onde reside, produziu em 2012, na homenagem que prestamos ao amigo comum in memoriam, a crônica abaixo, com a qual traz o passado ao presente, provando que para personalidades da expressão do saudoso Pirinho, o passado, o presente e o futuro, tudo é atualidade.
Semelhante ao escritor e jornalista Erivaldo de Souza Brito, que lá da cidade do Rio de Janeiro, onde reside, produziu em 2012, na homenagem que prestamos ao amigo comum in memoriam, a crônica abaixo, com a qual traz o passado ao presente, provando que para personalidades da expressão do saudoso Pirinho, o passado, o presente e o futuro, tudo é atualidade.
Pedro Borges dos Anjos
Editor-chefe do Jornal O Guarany
Editor-chefe do Jornal O Guarany
Eis a crônica:
MEMÓRIA
PIRINHO - UMA LIDERANÇA POLITICA AINDA VAGA
Por ERIVALDO BRITO
PIRINHO - UMA LIDERANÇA POLITICA AINDA VAGA
Por ERIVALDO BRITO
A história e a vida de Raimundo Rocha Pires, - Pirinho -, esse grande e saudoso baiano, estão a carecer de uma biografia bem elaborada a fim de alçá-lo à Galeria de Cachoeiranos Ilustres. É uma lacuna a ser preenchida, portanto, por alguém de maior envergadura literária do que o pobre memorialista.
Deve-se-lhe, também, a Cachoeira, sua terra natal, colocar o seu honrado nome em algum novo logradouro da cidade, numa prova de reconhecimento de uma vida pública como lídimo representante de uma terra empapada de tradição, feitos e vultos ilustres.
Conheci Pirinho recém-formado em odontologia, ponta direita do time do Real Atlético Clube cachoeirano, grande incentivador do basquetebol e professor catedrático do antigo Ginásio Estadual da Cachoeira. Ele foi professor dos meus irmãos Erione e Evandira, granjeando enorme popularidade entre o alunado pela metodologia, a dinâmica e a moderna comunicabilidade à disciplina que ministrava.
Pari passu ao magistério, Pirinho exercia a profissão de dentista com um bem montado e moderno gabinete no Edifício Hilda em São Félix. Foi lá que mantivemos o primeiro contato pessoal. Eu não havia dormido a noite toda, infernizado por um dente que nem Guaiacol deu jeito. Identifiquei-me como irmão de dois de seus alunos. Ele sorriu e fez elogios a ambos classificando-os de “alunos aplicados”.
Mandou que eu abrisse a boca e, na maior intimidade deu-me uma bronca: “Ô bandido, como é que você deixou ficar nesse estado? Não tenho como reparar com uma obturação, vai ter mesmo de extrair”, disse-me ao mostrar uma radiografia.
A grande novidade, - pelo menos para mim -, foi quando ele passou um produto na minha gengiva e eu nem senti a picada da agulha do anestésico. Não senti dor alguma. E ele exibindo a raiz com um pequeno pedaço do que restou da dentina como um troféu, ainda curtiu com a minha cara falando como os antigos faziam quando arrancavam os dentes de leite das crianças:
- Leve e jogue fora no rio dizendo boticão, boticão, leve o meu dente podre e me dê um são!”
Pirinho resolveu ingressar na vida pública disputando o cargo de chefe do Executivo de São Félix, onde ele possuía uma boa base familiar deixada pelo seu pai, Artur Pires e o sogro Dr.Nogueirol que inclusive havia sido prefeito por lá. A vitória foi retumbante. O apoio voluntário de seus alunos foi quase unânime a ponto de várias pessoas pedirem a mudança de domicílio eleitoral. Estava nascendo um novo líder político na região.
Durante a cheia do rio Paraguaçu em março de 1960, - ele já havia sido escolhido orador do 25 de Junho, pela primeira vez -, atravessando a quase instransponível montanha deixada pelas baronesas na semi-destruída ponte D. Pedro II, fui entrevistá-lo para o jornal A Tarde. Eu era o chamado “foca” respaldado pelo meu primo, Antonio Loureiro, que era Secretário do referido jornal.
Pirinho já era nome conhecido da mídia pelo fato de haver criado uma celeuma com o poder Judiciário. Ao passar pela prefeitura numa tarde de domingo, Pirinho foi alertado de que a prefeitura estava aberta. Era o juiz de direito Dr. Cavalcanti que havia entrado e estava na sala onde funcionava o fórum local. Pirinho não tomou conhecimento, foi lá e trancou a porta! O meritíssimo gritou, esbravejou, disse impropérios, palavras chulas e a patuleia adorou com o fato inusitado. Era o que se comentou na Região durante muito tempo gerando uma publicidade positiva a um prefeito ilustre e operoso que havia revelado um espírito altamente progressista. Então, amigos, o óbvio aconteceu: Pirinho iria disputar uma vaga para deputado estadual. Foi uma eleição fácil.
Na Assembléia Legislativa do Estado, Pirinho teve papel destacado, sobretudo na luta para a construção da barragem de pedra do cavalo e na solução para as enchentes periódicas que assolavam as duas cidades. Chegou a convocar o engenheiro Américo Simas que havia elaborado um projeto de construção de múltimo barramento do rio, ou um túnel que seria escavado do lado de São Felix com entrada no Varre Estrada e saída depois do farol, numa cota que, o volume de água chegasse a certo nível passaria a fluir as águas através do citado túnel, e não inundaria as duas cidades.
Foi dele, também, o projeto que considera o 25 de Junho feriado escolar em todo o estado da Bahia.
Não obstante ter sido um dos mais atuantes deputados, dedicando-se inteiramente à ingente tarefa de pessoalmente assistir aos mais carentes que o procuravam, avesso a conchavos e subserviência, faltava-lhe naturalmente recursos pecuniários para uma campanha política cada vez mais cara. Amigos seus, - dos quais humildemente me incluo -, custeavam faixas, impressos, aviar receitas médicas, remédios grátis, disponibilizar viaturas e ajuda para combustível.
No ano de 1973, deu-se a incorporação do antigo Banco da Bahia do qual eu era funcionário pelo Banco Brasileiro de Descontos – Bradesco-. Três anos depois, gozando de privilégios como gratificação de balanços (junho e dezembro), julina e natalina, além do 13º salário, fui considerado “caro”. Como era optante pelo FGTS, fui dispensado. Deixei de usar gravata e passei a andar de tamancos, pois eu passei a trabalhar na Fábrica de Papéis Tororó exatamente no setor de distribuição de produtos químicos usados na produção de papéis.
Certo dia, o meu saudoso amigo e vizinho professor Renato Queiróz, sem nada me dizer, deslocou-se até a pequena Chácara de Pirinho. Em lá chegando foi uma surpresa geral, afinal Renata jamais havia estado por lá. Pediu licença aos presentes e chamou Pirinho em particular para falar sobre as minhas dificuldades. A pergunta de Pirinho foi óbvia: “Por que Erivaldo não me procurou?” E Renato pintou com tintas negras a situação: “Pirinho, ele está fumando um cigarro e apagando pra fumar outras vezes!” Pirinho não se fez de rogado, no mesmo dia foi à minha procura, me abraçou dizendo uma frase que eu nunca mais esqueci: “Agora é a minha hora de ajudar você!”
Meus amigos, a emoção foi tão forte que, ainda hoje, enchi os olhos de lágrimas ao relembrar o fato. A longevidade é assim mesmo, deixa a gente emotivo demais.
Em Salvador, estive com Pirinho na residência do Dr. Antonio Carlos Magalhães. O poderoso político baiano deu-me uma recomendação ao Dr. Ângelo Sá, presidente do Banco Econômico que passou a bola para tal de Paulo Maciel, diretor de pessoal que marcou o meu retorno para a semana seguinte.
No dia agendado, fui recebido por uma funcionária que me encaminhou a uma sala onde dezenas de pretendentes a uma vaga estavam sentadinhos aguardando as provas.
Retornei a sala do diretor de pessoal que foi taxativo: o senhor terá de fazer um teste, pois é uma norma da empresa. Tive vontade de perguntar-lhe se havia feito algum teste para ser diretor, porém a prudência e a necessidade levaram-me a fazer-lhe um desafio:
“Doutor Maciel” – disse-lhe -, “realmente não estou preparado para submeter-me a um teste com disciplinas que já não lembro mais, no entanto, posso descer agora mesmo para a agência e trabalhar em qualquer setor que o senhor determinar”.
E ele realmente estava inflexível e eu mantive a posição que a minha dignidade de bancário com uma carreira de quase 15 anos exigia.
Conversei com Pirinho. Ele pensou em retornarmos a ACM. Face ao adiantado da hora, fomos até ao apartamento do professor Pedro Borges, que não obstante ser pego de surpresa, ofereceu-nos um lauto almoço, um cozido se não estou enganado. Pedrinho mantinha o Policenter em Salvador e era inclusive professor particular do próprio ACM.
A proposta do Econômico, depois que eu “ousei” em desafiar o diretor de pessoal era salário de inicial de carreira, ou seja, não daria nem para morar em um pensionato de quinta categoria.
No sábado, Pirinho foi-me buscar e fomos até a fazenda do pecuarista Benedito Luz. Com um simples telefonema de Benedito, fui admitido na Pedreira Valéria, do grupo Odebrecht com um salariozinho pouco melhor. E ia levando, quem sabe no futuro a coisa não melhoraria?
Num final de semana encontrei-me com Pirinho e fui franco, estava pagando para trabalhar. Ele então marcou comigo e fomos ao encontro do diretor técnico da Desenvale, o engenheiro Manoel Quintas e o presidente Domingos Lavigne. Saí já empregado e o que era melhor,em casa,nas obras de Pedra do Cavalo. Então passei a conviver mais próximo de Pirinho. Em uma de suas campanhas fizemos uma viagem longa até Sobradinho a fim de encontrarmos com Renato Rosal, prefeito local e costurar o seu apoio. Pirinho já era amigo do irmão dele, o médico Rui Rosal, que sucedeu Pirinho, depois, na presidência do Vitória.
Durante a longa viagem, fomos cantando velhos sucessos musicais. Pirinho gostava muito da marcha “Bandeira Branca” e elogiava o repertório de Ari Vicente, velho companheiro de viagem e de quarto onde tive de aturar os seus roncos e flatulências. Coisa de louco!
Lembro-me que Pirinho dizia o seguinte, quanto ao repertório de Ari Vicente: “Ari não se aperta, quando a memória falha ele inventa uma letra de sua autoria e pronto, a parceria está feita!”
Havendo constituído um novo casamento com a minha primeira namoradinha de infância, fomos visitá-lo certa noite de sábado. Pirinho veio receber-nos com aquele tradicional sorriso e a inseparável bermuda branca A minha esposa apresentou-se como uma pessoa que havia frequentado o chalé de Artur Pires quando menina, que era amiga de Licinha, (esposa de Humberto Oliveira). Quando ela falou que era filha do advogado Luiz Soares, Pirinho relembrou quanto o pai dele era amigo do pai dela, a ponto de haver batizado um dos seus irmãos com o nome de Luiz Artur.
Muito bem humorado, Pirinho contou-nos um caso interessante. Certa feita o seu pai resolveu fazer um escaldado de perus (assim mesmo no plural, pois foram várias as aves), e convidar os mais famosos gastrônomos das duas cidades e Pirinho nomeou alguns: Luiz Soares, Laudilio Melo, Walter Gavazza, Zeca Santana.
Com a palavra, Pirinho:
- Ao término do banquete, sabe que foi o maior glutão, quem mais comeu?
A minha mulher pensou, o óbvio:
- Papai!
E Pirinho dando aquela gargalhada:
- Quem ganhou foi Salu!
- Salu?
Para confirmar, Pirinho disse:
- Pois é... Salu! E olha que ele era mais magro do que é hoje! A passagem de Pirinho à frente do futebol cachoeirano foi altamente positiva. Com o seu inegável carisma e liderança, com a sua presença direta, arregimentou forças para concretizar um velho sonho dos esportistas cachoeiranos: a construção do seu estádio de futebol, o 25 de Junho, fundamental para a conquista de vários títulos intermunicipais.
Como presidente do Vitória – ele era torcedor do
Ipiranga -, fez uma administração notável. Além de montar uma equipe de
respeito onde despontavam jogadores do quilate de Osni, José Júlio e
Mario Sérgio, o técnico era o consagrado bi-campeão mundial, Aimoré
Moreira. Foi ele, também, quem deu início às obras do hoje Estádio Barradão. No
ano de 1983, Pirinho estava encarando um novo desafio: impulsionar o
Jockey Club de Salvador. Aquela tosse que sempre o incomodava e que ele
próprio atribuía ao tabagismo, por fim se identificava: um enfarto do
miocárdio fulminante. A notícia divulgada pelo noticiário da televisão
foi impactante para mim e minha esposa. Tive a mesma sensação de perda
ao ler no blog de O Guarany a notícia de que se completam já 21 anos no
dia 12 do corrente elaborando esta pálida homenagem a uma grande líder
político cuja ausência e cuja perda não foram preenchidas até hoje.
Flashes inesquecíveis:
Na
sessão solene do 25 de Junho de 1975, o então deputado Pirinho adentra
ao salão da Câmara, convidado para sentar-se em lugar de honra do
plenário da Casa.
Da
esquerda para a direita: Adjarva dias, Pirinho, o poeta Waldemar
Menezes, Nelson Burgos e Erivaldo Brito. Pirinho estava sendo
homenageado na Desportiva do Paraguaçu.
A torcida do Vitória até hoje tem saudade de Pirinho, que aparece na foto sendo homenageado com uma corbelha de flores.
Vejam no cartão a seguir como o saudoso deputado Pirinho dirigiu-se ao jornalista Erivaldo Brito, expressando-lhe gratidão por algo. O Cartão, com o timbre da Assembléia Legislativa da Bahia, redigido do próprio punho do emitente, no dia 20/12/1979, merece reflexão, tendo em vista como a manifestação do agradecimento ultrapassou o tempo, ante a reconhecida evidência de poder ser aplicada 33 anos depois, quando homenageamos a sua memória, que continua fortemente presente em cada um de nós, ao nosso lado, em nossas lembranças, como se entre nós esteja a comunicar-se com o mesmo entuasiasmo e brilhantismo do passado.
Vejam no cartão a seguir como o saudoso deputado Pirinho dirigiu-se ao jornalista Erivaldo Brito, expressando-lhe gratidão por algo. O Cartão, com o timbre da Assembléia Legislativa da Bahia, redigido do próprio punho do emitente, no dia 20/12/1979, merece reflexão, tendo em vista como a manifestação do agradecimento ultrapassou o tempo, ante a reconhecida evidência de poder ser aplicada 33 anos depois, quando homenageamos a sua memória, que continua fortemente presente em cada um de nós, ao nosso lado, em nossas lembranças, como se entre nós esteja a comunicar-se com o mesmo entuasiasmo e brilhantismo do passado.
Assembléia Legislativa da Bahia
20/12/79
Erivaldo, bom amigo,
Muito grato pela sua lembrança.
Tudo de bom para os seus familiares.
Abraços,
Pirinho
Abraços,
Pirinho




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