segunda-feira, 18 de junho de 2012

ACONTECEU NA CIDADE DA CACHOEIRA/BAHIA

MEMÓRIA
MEU COMPADRE, ASTÉRIO
Por Erivaldo Brito


Foi com o mais profundo dos pesares que eu li em o blog do jornal O Guarany, sobre a morte de Astério de Araújo Góes. De pronto pensei em fazer uma pequena crônica, mesmo cônscio de que o meu armazenamento cerebral de adjetivos seria insuficiente para escrever o panegírico a fim de homenageá-lo, embora palidamente, por certo. Ele foi meu compadre e colega do Banco da Bahia. Aliás, não apenas colega, que é uma situação transitória e que independe, por vezes, da nossa vontade; era meu amigo fraterno.
Conheci Astério como Office Boy do Banco de Administração que funcionava na Rua Ruy Barbosa, a Rua das Lojas dos áureos tempos do vibrante comercio de tecidos da Cachoeira. Trabalhavam no referido estabelecimento creditício; Augusto Régis (fundador da “Pharmacia Régis”), Laudílio Melo, Godinho, Carlos Sales, Osmundo Araujo, Zeca Santana e dona Amália, irmã de Benedito Luz.
Tempos depois, o Banco de Administração foi encampado pelo Banco da Bahia e Astério foi promovido às funções de Caixa.
Quando da minha transferência da Agência Candeias para São Félix e depois Cachoeira, tornamo-nos amigos a ponto de quando eu postulei uma vaga para o Legislativo, apareceu voluntariamente como meu cabo eleitoral. Devo, portanto a ele, meus irmãos, familiares e Lourival Melo, (outro amigo que também já está na Glória), ter sido eleito sem distribuir “santinhos”, colocar faixas ou qualquer outro meio de propaganda.
Jamais o vi envolvido em acusações, insultos ou xingamentos mesmo quando o seu Botafogo não ia bem no campeonato Carioca.
Certa manhã, ao chegarmos para o expediente, sentado no jardim bem em frente à agência estava o Inspetor do Banco, o temido Pinheirão. Astério falou baixinho: “Ainda bem que o meu caixa está batendo”. O caixa é exatamente a primeiro a ser inspecionado. O Inspetor, de posse do Balancete, contou todas as cédulas, as moedas, o dinheiro fora de circulação por estarem estragados e para serem levados para trocar no Banco do Brasil (não existia Banco Central), os cheques de outras agências para serem compensados e, por fim, os cheques da própria agência.
De repente Pinheirão chamou o Correntista e o inquiriu:
- Senhor Martfeld, o senhor tem costume de passar cheques pré-datados?
A resposta veio imediata:
- Não, senhor!
E o inspetor Pinheirão voltou à carga:
- O senhor não passa cheque sem a devida provisão de fundos?
E o Correntista respondeu com firmeza:
- Não, não senhor!
E o tal do Inspetor durão, com um sorriso maldoso nos lábios, exibindo um cheque:
- Então, o senhor pode me dizer quem emitiu este ”borrachudo”?
O funcionário gelou, mas, não escondeu a verdade:
- Ontem, quando do fechamento do expediente, o colega Astério necessitou de dinheiro emprestado para fazer a composição do caixa e ninguém tinha. Ele pediu um cheque, mas, eu havia dito que não tinha certeza se havia saldo na conta, ficando de sanar o problema hoje.
A providência imediata do inspetor foi retirar Astério de suas funções, já com o expediente iniciado. Foi então que escutamos todos o barulho do motor do “Vemaguete” do gerente da agência, Hermes Simões. Logo ao chegar seu Hermes foi logo dizendo em tom de pilheria:
- Que desgraça! Esse pessoal da inspetoria quando aparece é só pra atrapalhar...
E o inspetor dirigindo-se a ele:
- Olha seu Hermes, está existindo algo de estranho, um entrosamento perigoso entre o Caixa e o Correntista e eu resolvi suspender o seu Astério...
Seu Hermes nem o deixou terminar a frase e ordenou:
- Astério, volte para o caixa, imediatamente.
E voltando-se para o Inspetor:
- Meu caro, esta agência tem um gerente que sou eu. Astério tem a minha absoluta confiança e, enquanto eu for o gerente, ele vai permanecer como caixa.
O Inspetor arrumou os papéis e foi-se embora. Todo mundo pensou: “Ih, vai dar merda!”.
Seu Hermes então se dirigiu aos funcionários envolvidos:
- Agora vocês me contem o que foi que houve, por favor.
Sentou-se na velha máquina de escrever Remington e relatou os fatos para a Diretoria do Banco, dando ênfase ao coleguismo, mas, reconhecendo que o seu funcionário Astério “havia errado por excesso de zelo, porque simplesmente poderia cobrir a diferença 24h depois!”.
Astério era um homem simples, honesto, porém, poderia ter a sua ficha funcional manchada, não fora aquela atitude arrojada de um gerente que sabia das suas atribuições.
Sem grande ambições pessoais, embora houvesse sido eleito Vereador, não obstante haver sido promovido após o incidente que narramos acima, Astério aceitou um emprego humilde na Prefeitura a fim de complementar a sua aposentadoria.
Astério de Araújo Góes, meu compadre, foi um cachoeirano de subido mérito aliado a um caráter puro e apreciáveis dotes de espírito.



*Erivaldo Brito, cachoeirano, advogado, radicado na cidade do Rio de Janeiro/RJ

Nenhum comentário:

Postar um comentário