Bitedô – Onde Moram Os Nagôs
Consubstanciado em exaustiva pesquisa documental, arrebanhada desde a sua tese de mestrado, o autor conseguiu derrubar toda e qualquer lenda que predominava sobre o assunto.
O evento teve o apoio do Centro de Articulação de População Marginalizada, CEAP, e o patrocínio da Petrobras, enriquecido com palestrantes especializados em Estudos Étnicos e Africanos, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. No plenário estavam jovens acadêmicos, Ogãs e Ialorixás de diversas Casas e estados brasileiros.
O momento mais aguardado foi, efetivamente, a tarde de autógrafos do livro “Bitedô – Onde Moram Os Nagôs” que, no dizer do secretário executivo do CEAP, Ivanir dos Santos, babalawo Ifá Wole, “é um belo presente dado por Cacau Nascimento que levará o leitor a uma reflexão mais aprofundada acerca do legado cultural Jejê Nagô no Brasil”.
Uma extensa fila se formou em torno do autor para os autógrafos. Ele a todos atendia com a sua habitual afabilidade.
Analisando a sua própria obra, Cacau tem a consciência de que “não é o primeiro trabalho sobre a formação do candomblé no Recôncavo baiano, no entanto, possui o mérito e a primazia de discutir o tema, tendo como foco analítico redes de sociabilidade gestadas em núcleos residenciais formados por escravos e libertos de origem africana variada”.
Outro ponto que merece aplausos no livro, é que Cacau não deixou de citar a fonte consultada, dando o merecido crédito aos seus autores.
A sua pesquisa deve ter sido um trabalho hercúleo, em vista mesmo da precariedade ou total ausência de livros, jornais e outros documentos na cidade da Cachoeira, empapada de filhos ilustres e de glórias, todavia, sem qualquer cuidado com o seu passado e seu acervo. Lembro, por oportuno, que na grande cheia do rio Paraguaçu, a maior de todas, no ano de 1960, estava no passeio dos Correios olhando que as águas vindas da praça Dr. Milton se juntaram com a Rua Ana Néri, quando de repente ouvi uma voz me chamando pelo apelido de família. Virei-me e deparei-me com o velho comerciante Lafayette Almeida, grande amigo da família Soares onde fui criado. Ele pedia socorro, porque veraneando em sua “Chácara Nova Brasília”, na zona rural, havia dimensionado mal o comportamento do rio e as águas já atingiam o sobrado de sua propriedade na Rua 13 de Maio, frente ao antigo prédio onde funcionou a Escola Industrial. Pegamos a canoa de Tibúrcio; ele, eu e Wilson “Galo Doca” e fomos salvar o que foi possível.
Depois que as águas baixaram, ao passar pela Rua Ana Néri, no passeio do sobrado da Desportiva, hoje pertencente a Prefeitura e sede do Gabinete do Prefeito, lá estava uma pilha de documentos de compra, venda, cadastramento e processos de alforrias de escravos, empilhados há varias décadas no Cartório da família Helvécio Sapucaia, e que tinham virado lama!
Devido a proximidade do Arquivo Nacional com a Rádio MEC, encaminhei-me até lá, na expectativa de encontrar-me com Adelson Alves, que foi, no passado, produtor de Os Tincoãs.
Ao dirigir-me até a recepção da emissora, identifiquei-me. Adelson havia acabado de chegar para gravar o seu programa. A recepcionista interfonou e ele, num espaço de dez minutos se fez presente. Não nos conhecíamos pessoalmente, ainda. Apresentei-me com membro do grupo original do trio, que havíamos nos falado ao telefone, quando Heraldo era vivo, porque ele pretendia reunir no seu programa a formação original de Os Tincoãs, o que infelizmente não ocorreu.
Em poucos instantes, parecíamos velhos conhecidos. Adelson é realmente “um papo legal”, bordão que ele usa em seus programas radiofônicos, na Radio MEC e Nacional do Rio de Janeiro.
De grande relevância foi o relato de que ele veio a me fazer e que ele autorizou-me a publicar. Contou-me que ele ficou encantado com a vocalização do trio, no entanto, não obstante a declaração de que Dadinho pertencia à Casa do Ventura, não tinha certeza de que a pronúncia em iorubá condizia com o real ou era pura enrolação. Quando menos esperava, esteve no seu programa da madrugada, na Radio Globo, um antropólogo norte americano chamado Paul Francis Kaiodo que se prontificou a ouvir Os Tincoãs cantando. A conclusão a que ele chegou foi que, Os Tincoãs, não apenas cantavam bonito, estavam utilizando o idioma iorubá de mais de 250 mil anos, isto mesmo, 250 mil anos, preservado pelos africanos da Cachoeira.
Numa excursão promovida por Martinho da Vila para Angola, - prosseguiu Adelson -, Os Tincoãs se apresentaram para o presidente. Quando retornaram ao camarim, foram surpreendidos com a presença do ministro da Cultura, que era professor de etimologia da Universidade local, curioso porque no canto do trio surgiam muitas palavras que ele próprio não tinha resposta quando perguntado pelos alunos.
Por fim, tendo de ausentar-se para gravar, Adelson finalizou dizendo que Os Tincoãs têm uma gravação ainda inédita com o Grupo Coral dos Correios, sob a regência do renomado maestro Heitor dos Prazeres. Está aguardando apenas o patrocínio da Petrobras para que o CD seja distribuido gratuitamente.
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