sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

CAIRO/EGITO


Discurso de Mubarak é decepcionante e pode levar a um golpe, diz especialista

A transição política no Egito começou, e caberá às Forças Armadas daquele país ditar seu ritmo. Porém, a possibilidade de um golpe de Estado não pode ser descartada. Essa é a conclusão do discurso proferido pelo presidente egípcio Hosni Mubarak e de toda a agitação pela qual passou o país árabe nesta quinta-feira (10/02) na opinião do professor da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp, Héctor Luis Saint-Pierre.

Especialista nas áreas de segurança internacional, defesa e guerra, Saint-Pierre mostrou-se um tanto surpreendido com o discurso do ditador egípcio, já que, assim como os demais observadores internacionais, esperava sua renúncia. “Foi um discurso decepcionante. A insatisfação social do país só deverá crescer. Mubarak está há décadas no poder, não é inexperiente. O que passa a estar em jogo no país não é mais a queda do presidente, mas a do regime, o que são coisas diferentes. Toda a estrutura de base do Egito está militarizada”, afirma.

Para o analista, o discurso de Mubarak deve ser levado em conta juntamente com o comunicado do Conselho Supremo das Forças Armadas, divulgado em rede nacional pela TV, o qual afirmava dar apoio “às legítimas demandas do povo” e que continuaria a se reunir continuamente para examinar “as medidas tomadas para proteger a nação”.

Leia mais:
Raiva e decepção tomam conta da praça Tahrir após discurso de Mubarak Egito: protestos contra o governo são ampliados e ultrapassam limites da praça Tahrir
Demandas de manifestantes incluem criação de governo civil, diz especialista Repressão, controle da economia e apoio internacional sustentaram Mubarak, avaliam historiadores
Os militares e o futuro do Egito Nas ruas do Cairo há mais ordem do que no que resta do governo Euforia, banho de sangue e caos no Egito

“A impressão é que esse discurso deixa a porta aberta para um golpe, no qual o Exército assumiria a inspiração popular através de um movimento de libertação”, afirma. A hipótese das Forças Armadas começarem a reprimir a população para proteger Mubarak até setembro é considerada remota para Saint-Pierre. Ou seja, tanto se ficar ao lado de Mubarak quanto se unir aos manifestantes e tentar destituí-lo, os militares permanecerão no comando do processo de transição.

“A dúvida é se ela vai ser controlada só pelos militares ou se contará com uma participação efetiva da sociedade civil, como a Irmandade Muçulmana e novos grupos políticos, alguns deles se formando na Praça Tahrir. Mas isso pode durar anos. Um regime não cai de um dia para o outro”, disse Saint-Pierre, lembrando vários casos ocorridos na América Latina. “O grande problema para a oposição será o pós-Mubarak [independente da possibilidade dele ser deposto]. Inicialmente, os opositores se unem para a queda de um ditador. Na medida em que se encontram para definir as novas diretrizes do país, passam a se dividir”.

Isso só facilitaria a situação para os militares, que teriam caminho aberto para manter o poder central. “O foco deles é manter o poder central, ou seja, ter o poder das decisões estratégicas, de última instância”. O cenário é ainda mais favorável aos militares, segundo Saint-Pierre, porque a instituição das Forças Armadas é bem vista pela população. “A antipatia da população é mais concentrada nos políticos, na política e nos órgãos de inteligência”, lembrou.

Nenhum comentário:

Postar um comentário