Pletz
O importante matutino israelense Ha'Aretz publica uma manchete que ocupa toda a largura de sua primeira página: "O MINISTRO DO TURISMO RECEBEU ENTRADAS VIP NO VALOR DE MILHARES DE SHEKELS PARA O ESPETÁCULO DA MADONNA".
De início pensei que era alguma gozação do jornal, alguma piada, mas, logo após a leitura do texto, me dei conta de que era um assunto muito sério. O Ministro, cujo nome é muito complicado para ser transliterado, confirmou que recebeu cinco entradas de graça. No entanto, o produtor do show exigiu um pagamento por vinte e cinco entradas, e o Procurador Geral do Estado, já em 2005, proibiu representantes do povo de receberem entradas para espetáculos teatrais.
A decisão do Procurador Geral não deixa margem a dúvidas quando proibiu o recebimento de entradas, pois isto iria de encontro à lei que proíbe servidores públicos de receberem presentes, e que também detalha quando um servidor pode receber uma entrada gratuita para participar de uma apresentação pública: só quando se tratar de algo de interesse nacional como, por exemplo, uma festividade comemorativa de algum acontecimento histórico da nação e outros similares.
Esse não é o primeiro caso em que um servidor público israelense se vê seriamente admoestado por causa de um aparente banal presente. Recordo que, anos atrás, um importante funcionário de um tribunal israelense prestou um favor a outro importante funcionário do Estado, dando-lhe uma informação sobre o envolvimento de seu filho num simples problema de trânsito. Por este favor, ele ganhou uma entrada para uma peça de teatro, o que lhe saiu, depois, muito caro: perdeu o emprego e todas as vantagens dele decorrentes.
Ora, dirá o leitor, isso parece um tanto quanto exagerado. Só por causa de uma entrada, "fazer todo este carnaval"? Dá a impressão de que Israel não tem outros problemas para cuidar. Mas não é certo. Aqui se trata de uma questão muito séria de princípios e da honestidade a que se obriga um servidor público, seja eleito ou nomeado.
Existe corrupção em Israel? A resposta é afirmativa: sim, existe. E há uma campanha e um inclemente combate à corrupção em todos os níveis oficiais, desde a mais remota e pequena municipalidade até aos altos escalões governamentais. E o atual Procurador Geral do Estado é o paladino deste combate que ceifou a carreira de não poucos importantes funcionários e políticos.
Não se trata de simples "caça às bruxas". A campanha contra a corrupção e as condenações são proclamadas altissonante e, quanto mais elevado o cargo do transgressor, maior a divulgação do seu nome e do castigo que lhe é imposto. Não é preciso citar nomes, mas, no momento, alguns ex-deputados e até um certo ministro cumprem longas penas de prisão, isto para não falar de um ex-primeiro-ministro e de um ex-presidente de Israel cujos processos criminais contra eles estão em pleno curso.
O playboy que for agarrado pela polícia guiando seu veículo em alta velocidade e um tanto "alegre" por algum excesso alcoólico, ao ser parado e obrigado a descer do seu veículo não se atreverá a dizer aos policiais o arrogante alerta de que "você sabe com quem está falando?". Se isso ocorrer, ele será tratado melhor do que qualquer outro contraventor. Possivelmente levará algumas bordoadas e será encarcerado in continenti por desafio à autoridade ou, conforme o pleonasmo, por "tentativa de fuga".
Longe de mim transmitir aos meus leitores a falsa idéia de que Israel está povoada por sete milhões de anjos e apenas alguns malfeitores. Não é verdade: temos aqui todos os tipos de crimes e contravenções constantes em qualquer cardápio do Código Penal. O que é importante, sim, é consignar o posicionamento do Poder Judiciário, que não faz distinção, nas suas decisões, entre o simples contraventor e o importante homem público que traiu a confiança nele depositada. E ambos serão julgados e punidos de acordo com a Lei. E, nesse ponto, aqui ninguém vale mais ou menos do que ninguém.
O que vai acontecer com o Ministro do Turismo? O jornal fez um grande estardalhaço. O ministro se justificou e deu todas as suas explicações do porquê ter aceito as entradas para assistir ao show da Madonna, ingressos esses que também foram entregues ao chefe de seu gabinete e mais a algum outro funcionário. O que vai acontecer com o Ministro? De momento, a resposta é irrelevante. O importante aqui é assinalar o fato de que é obrigação do servidor público atuar de mãos limpas no exercício de suas funções.
Portanto, quando um servidor público quiser ir ao teatro com sua esposa ou outra companhia deverá pagar pelos ingressos de seu próprio bolso. O princípio vale para as pequenas e para as grandes coisas.
De graça é proibido.
*Marcos Wasserman é advogado em Israel, Brasil e Portugal, e é presidente do Centro Cultural Israel-Brasil em Tel Aviv. E-mail: mlwadvog@netvision.net.il
O importante matutino israelense Ha'Aretz publica uma manchete que ocupa toda a largura de sua primeira página: "O MINISTRO DO TURISMO RECEBEU ENTRADAS VIP NO VALOR DE MILHARES DE SHEKELS PARA O ESPETÁCULO DA MADONNA".
De início pensei que era alguma gozação do jornal, alguma piada, mas, logo após a leitura do texto, me dei conta de que era um assunto muito sério. O Ministro, cujo nome é muito complicado para ser transliterado, confirmou que recebeu cinco entradas de graça. No entanto, o produtor do show exigiu um pagamento por vinte e cinco entradas, e o Procurador Geral do Estado, já em 2005, proibiu representantes do povo de receberem entradas para espetáculos teatrais.
A decisão do Procurador Geral não deixa margem a dúvidas quando proibiu o recebimento de entradas, pois isto iria de encontro à lei que proíbe servidores públicos de receberem presentes, e que também detalha quando um servidor pode receber uma entrada gratuita para participar de uma apresentação pública: só quando se tratar de algo de interesse nacional como, por exemplo, uma festividade comemorativa de algum acontecimento histórico da nação e outros similares.
Esse não é o primeiro caso em que um servidor público israelense se vê seriamente admoestado por causa de um aparente banal presente. Recordo que, anos atrás, um importante funcionário de um tribunal israelense prestou um favor a outro importante funcionário do Estado, dando-lhe uma informação sobre o envolvimento de seu filho num simples problema de trânsito. Por este favor, ele ganhou uma entrada para uma peça de teatro, o que lhe saiu, depois, muito caro: perdeu o emprego e todas as vantagens dele decorrentes.
Ora, dirá o leitor, isso parece um tanto quanto exagerado. Só por causa de uma entrada, "fazer todo este carnaval"? Dá a impressão de que Israel não tem outros problemas para cuidar. Mas não é certo. Aqui se trata de uma questão muito séria de princípios e da honestidade a que se obriga um servidor público, seja eleito ou nomeado.
Existe corrupção em Israel? A resposta é afirmativa: sim, existe. E há uma campanha e um inclemente combate à corrupção em todos os níveis oficiais, desde a mais remota e pequena municipalidade até aos altos escalões governamentais. E o atual Procurador Geral do Estado é o paladino deste combate que ceifou a carreira de não poucos importantes funcionários e políticos.
Não se trata de simples "caça às bruxas". A campanha contra a corrupção e as condenações são proclamadas altissonante e, quanto mais elevado o cargo do transgressor, maior a divulgação do seu nome e do castigo que lhe é imposto. Não é preciso citar nomes, mas, no momento, alguns ex-deputados e até um certo ministro cumprem longas penas de prisão, isto para não falar de um ex-primeiro-ministro e de um ex-presidente de Israel cujos processos criminais contra eles estão em pleno curso.
O playboy que for agarrado pela polícia guiando seu veículo em alta velocidade e um tanto "alegre" por algum excesso alcoólico, ao ser parado e obrigado a descer do seu veículo não se atreverá a dizer aos policiais o arrogante alerta de que "você sabe com quem está falando?". Se isso ocorrer, ele será tratado melhor do que qualquer outro contraventor. Possivelmente levará algumas bordoadas e será encarcerado in continenti por desafio à autoridade ou, conforme o pleonasmo, por "tentativa de fuga".
Longe de mim transmitir aos meus leitores a falsa idéia de que Israel está povoada por sete milhões de anjos e apenas alguns malfeitores. Não é verdade: temos aqui todos os tipos de crimes e contravenções constantes em qualquer cardápio do Código Penal. O que é importante, sim, é consignar o posicionamento do Poder Judiciário, que não faz distinção, nas suas decisões, entre o simples contraventor e o importante homem público que traiu a confiança nele depositada. E ambos serão julgados e punidos de acordo com a Lei. E, nesse ponto, aqui ninguém vale mais ou menos do que ninguém.
O que vai acontecer com o Ministro do Turismo? O jornal fez um grande estardalhaço. O ministro se justificou e deu todas as suas explicações do porquê ter aceito as entradas para assistir ao show da Madonna, ingressos esses que também foram entregues ao chefe de seu gabinete e mais a algum outro funcionário. O que vai acontecer com o Ministro? De momento, a resposta é irrelevante. O importante aqui é assinalar o fato de que é obrigação do servidor público atuar de mãos limpas no exercício de suas funções.
Portanto, quando um servidor público quiser ir ao teatro com sua esposa ou outra companhia deverá pagar pelos ingressos de seu próprio bolso. O princípio vale para as pequenas e para as grandes coisas.
De graça é proibido.
*Marcos Wasserman é advogado em Israel, Brasil e Portugal, e é presidente do Centro Cultural Israel-Brasil em Tel Aviv. E-mail: mlwadvog@netvision.net.il
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