Indiciamento de Lula passa a preocupar, de fato, a cúpula petista
Os fortes indícios de que aponta no horizonte político brasileiro um
novo julgamento espetaculizado, nos moldes do que foi o da Ação Penal
470, no Supremo Tribunal Federal (STF), conhecido como ‘mensalão’,
levaram um grupo de líderes do Partido dos Trabalhadores (PT) a se
reunir para uma avaliação mais ampla do quadro de dificuldades que se
avizinha. Para um dos integrantes do encontro nesta manhã de sábado, na
capital paulista, em uma ligação por telefone com o Correio do Brasil,
“o quadro é mais sério do que se imagina”. Não resta dúvida, para este
interlocutor de peso na direção da legenda, que os adversários controlam
boa parte do Judiciário, em suas camadas mais altas. “É sintomático”,
para o líder petista, o fato de a Procuradoria da República no Distrito
Federal (PRDF) aceitar o inquérito aberto após as denúncias do réu na AP
470 Marcos Valério, condenado a 40 anos de prisão, de que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria, de alguma forma, envolvido no escândalo.
Na mesma linha, o autor do Blog da Cidadania, Eduardo
Guimarães, publicou nas primeiras horas da manhã que “um ‘passarinho’
muito bem informado” lhe contou que o PT está “preocupadíssimo com o
recente indiciamento de Lula” pela PRDF. Ainda segundo Guimarães,
que é também advogado, “para todos os efeitos, portanto, Lula foi
indiciado. A tecnicalidade não muda a situação. Aliás, o próprio
noticiário aponta para isso”, disse.
No artigo publicado, o blogueiro lembra que este “é o primeiro
inquérito aberto com o objetivo único de investigar se Lula atuou no
‘mensalão’, apesar de a Ação Penal 470 (iniciada em 2007 pelo Supremo
Tribunal Federal) tê-lo investigado antes de aceitar a denúncia da
Procuradoria Geral da República. Tanto o ex-procurador-geral Antonio
Fernando de Souza – autor da denúncia do escândalo – quanto o STF,
porém, à época entenderam que não havia elementos para indiciar Lula
juntamente aos outros 38 acusados naquela ação penal”.
“Lula, portanto, jamais foi indiciado como alvo específico. Assim, o
significado do que acaba de ocorrer é muito maior do que se pensa, ainda
que o alarde da mídia sobre o fato (…) esteja esperando a hora certa
para ter início”, acrescentou.
De acordo com o articulista, “a investigação que começa a tramitar na
Procuradoria do Distrito Federal, segundo petistas graúdos – que só
agora começam a se preocupar de verdade com a utilização do MPF e do
Judiciário por seus adversários políticos –, tem todas as
características da AP 470 e já é dado por aqueles ‘petistas graúdos’
como certo que deverá ter o mesmo destino, se nada for feito enquanto é
tempo”.
“Em primeiro lugar, lembremo-nos de que o julgamento do ‘mensalão’
subverteu toda ordem jurídica e as jurisprudências conhecidas, inovando
em procedimentos e critérios, chegando ao ponto de dar tratamento
diferente àquele inquérito do que foi dado a outros absolutamente
iguais, como no caso do desmembramento do processo quanto aos réus que
não tinham foro ‘privilegiado’, o que não foi feito com o inquérito do
‘mensalão tucano’. Dessa maneira, esqueçamo-nos de que Lula não tem mais
foro privilegiado e de que, assim, não pode ser julgado pelo STF, tendo
direito ao que aquela Corte negou a réus da AP 470 que tampouco
deveriam ser julgados por ela: o duplo grau de jurisdição”, assinala.
Guimarães também lembra que “a desvantagem do ‘foro privilegiado’
para réus de ações penais é a de que o STF pode, a seu bel prazer,
antecipar prazos e criar jurisprudências, como aconteceu no caso da AP
470, com sua teoria do ‘domínio do fato’, ou negar um desmembramento da
ação que fora concedido a outra praticamente idêntica, só que envolvendo
o PSDB e não o PT. Para réus de ações penais, portanto, o ‘foro
privilegiado’ não traz privilégios”.
Mas a armadilha para o ex-presidente Lula, segundo Guimarães, é que o
STF pode, “sim, arrogar para si o julgamento do ex-presidente, caso a
Procuradoria do Distrito Federal opte pela abertura de ação penal contra
ele, pois aquela Corte pode entender que a característica da denúncia a
enquadra no mesmo processo que condenou José Dirceu e companhia petista
limitada. O Supremo Tribunal Federal começou o julgamento dos 38 réus
do escândalo do ‘mensalão’ no dia 2 de agosto de 2012. Já nos primeiros
momentos de um processo visto por inúmeros e respeitados juristas como
um julgamento de exceção pelas inovações que perpetrou, já era possível
prever no que daria. Naquele primeiro momento, movimentos sociais e
sindicatos ligados ao PT, tais como MST, CUT etc., prometeram
mobilização, manifestações, ações que visassem mostrar aos que
pretendiam promover uma farsa jurídica que a sociedade civil não a
aceitaria. Porém, ficou só no gogó”, repara.
A indecisão do PT, diante do ataque pesado às forças progressistas em
duas frentes: no STF e na mídia conservadora, custará muito caro no
futuro, calcula Guimarães: “Lula se calou – e até hoje segue calado – e
Dilma manteve uma distância daquela vergonha que, anotem aí, irá lhe
cobrar um preço muito mais alto do que pode sequer imaginar. E que não
se resumirá à muito maior dificuldade que terá em se reeleger, caso seu
principal cabo eleitoral, ano que vem, seja alvo de uma ação penal no
Supremo. Lula, hoje, é o alvo mais apetitoso não só da direita midiática
brasileira, mas da de toda a América Latina. Não é apenas o maior
eleitor do Brasil. Com a morte de Hugo Chávez, vai assumindo o posto de
líder máximo da esquerda na região. Levá-lo à desmoralização – e quem
sabe até ao cárcere – é um dos sonhos mais acalentados por essa
direita”, acrescentou.
O cenário de uma eventual retomada do poder por parte das forças
reacionárias, no Brasil, seria o pior possível para a os setores
progressistas da sociedade. “Com a esquerda brasileira apeada do poder,
um efeito dominó será desencadeado pela América Latina. Com a direita
governando a maior potência regional haverá rompimento de acordos e até
sufocamento de governos de esquerda em países como Argentina, Bolívia,
Equador, Peru, Venezuela e outros. Para o Brasil, a volta da direita
midiática ao poder será a maior desgraça de sua história. Essa retomada
do poder visa interromper um processo que está eliminando a
característica mais perversa deste país, a de pátria da desigualdade.
Alguém acha que não gostam de Lula e do PT por serem feios, sujos e
malvados? A direita midiática não gosta deles porque é formada por uma
elite étnica e regional minúscula que durante o nosso meio milênio de
história concentrou uma parte indecente da renda nacional, colocando o
Brasil como o país virtualmente mais injusto do mundo até hoje”, afirma.
Monopólio da mídia
Lula percebeu, há muito tempo, o risco que corre a democracia
brasileira e os avanços sociais realizados durante seus oito anos de
mandato, caso permaneça como está a política nacional de comunicação, com apenas nove famílias no comando dos principais jornais, revistas e canais de TV do país.
A frente da informação, segundo avalia aquele interlocutor, que
preferiu o anonimato “para não dar munição aos adversários”, é hoje um
dos pontos cruciais para “a sobrevivência não apenas do PT, mas das
forças progressistas e do próprio governo Dilma”.
– Está cada vez mais profundo o fosso que separa uma parcela
considerável do partido e a política de comunicação social do Palácio do
Planalto. Hoje, arrisco dizer que já é visível, para a maioria da
direção do PT, que está completamente furada a tese de que é preciso
agir, e pagar milhões de reais por isso, como se o país vivesse um
período de normalidade democrática, dentro de um setor integralmente
moldado pela ditadura militar e o poder econômico que a instituiu e
manteve ao longo de mais de 20 anos. Este é o mesmo poder que manipula
uma parcela do Judiciário e controla a mídia conservadora. E o que é o
pior, exerce esse controle com recursos públicos. É impensável seguir
adiante com este modelo, defendido por grande parte da base aliada e os
ministros da área, a saber: a secretária de Comunicação Social, Helena
Chagas, e o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo – apontou.
Mesmo Lula, que normalmente evita tocar no assunto, não deixou
dúvidas quanto à necessidade de uma reforma no setor, com o
estabelecimento de marcos regulatórios que impeçam a formação dos
cartéis e da concentração crescente, hoje, na área da Comunicação
Social, no Brasil. Em discurso na noite desta quinta-feira, em
Montevidéo, Lula foi enfático:
– Não pode haver um monopólio dos meios de comunicação.
O ex-presidente reconhece que, “no Brasil, nós temos nove famílias
que determinam praticamente todo o poderio dos meios de comunicação”, e
mudar este cenário “não é fácil”.
– Fizemos uma grande conferência, no Brasil, de que participaram
milhares de pessoas e aprovamos um programa que agora está sendo
discutido no Ministério das Comunicações para ver como se encaminha o
debate para a sociedade avançar. Porque nós queremos avançar, não
queremos polemizar. O que nós queremos é provar que uma legislação que
tem uma regulação feita em 1962 não vale para 2013. Não vale porque a
gente não tinha um terço das coisas que nós temos hoje – finalizou.
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